tem uma coisa aqui que ainda não sei decifrar o código do
significado 7776668 é o número do apartamento na quinta avenida e não estou em
new york nem em bagdá estou mirando itapoã em salvador dali me disse: meus
bigodes são mais lindos do que qualquer fellini no cinema meu sangue está na
lama misturado a cocaína com a língua clara dessa gosmenta gelatina - enquanto
do outro lado da avenida joaquim pedro de andrade me pergunta: e por onde
andará macunaíma?
Artur Gomes
leia mais no blog https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/
imagem: Basquiat
para Drummond, Darcy Ribeiro, Brizola
e Oscar Niemayer in Memória
a rosa de Hiroshima ainda fala
a rosa de Hiroshima ainda cala
Frida e seus cabelos de aço
Picasso pintou Guernica
e quando os generais de Franco
lhe perguntaram:
- foi você quem fez isso:?
ele prontamente respondeu
- não, foram vocês que fizeram.
Cartola um dia me disse
que as rosas não falam
simplesmente as rosas exalam
o perfume que roubam de ti
Agora trago a Rosa do Povo
para os dias de hoje nesse Templo
escuro
quem poderá viver nesse presente?
quem poderá prever nosso futuro?
nem Zeus nem o diabo que os carregue
eu quero um reggae um arte lata
a vida é muito cara nada barata
eu sou Drummundo Curumin - no fundo
Tupã Rebelde não pede arrego
poesia é pra tirar o teu conforto
poesia é pra bagunçar o teu sossego
*
educação gramatical
ela tem um travessão
atravessado
na frente da palavra quero
me diz: espera
não por falta de desejo
tenho medo de dois pontos:
os seus olhos os seus beijos
pra onde você quer me levar
de tudo que a exclamação possa
engendrar
respondo:
coloco vírgulas ponto e vírgulas
reticências qualquer outro sinal
abro parênteses
(os meus poemas nunca vão ter ponto
final)
Bolero Blue
beber desse conhac em minha boca
para matar a febre nas entranhas
entre dentes - indecente é a forma
que te como bebo ou calo
e se não falo quando quero
na balada ou no bolero
não é por falta de desejo
é que a fome desse beijo
furta qualquer palavra presa
como caça indefesa
dentro da carne que não sai
Teatro do
Absurdo
o
quarteto da hipotenusa
versus
o quadrado do quarteto
da
hipotenusa a musa no quadrado
do
retrato fosse apenas fotografia
mas
não sendo hipotenusa
somente
musa algaravia
uma
palavra mais que estrada
sendo
musa multivia
me
levou nessa jornada
para
fora da bahia
todos
os santos mar aberto
no
abismo a fantasia
de
querer musa entretanto
muito
mais que poesia
A flor dos meus delírios
tem cheiro de poesia
relâmpagos de Iansã
incêndio no meio dia
Netuno em polvorosa
me disse em verso e prosa
que ela vem com o frescor da maresia
e eu serei o seu Ogum
anjo da guarda e companhia
hoje mesmo distante
essa preamar me incendeia
ondas espumas explodem na areia
tempestades trovoadas ventania
e nem sei se estando perto
calmaria
tirar
leite das pedras
plantar
flores no deserto
talvez
seja esta a minha sina
colher
a lírica
na
argamassa do concreto
metáfora
meta dentro
meta fora
que a meta desse trem agora
é seta nesse tempo duro
meta palavra reta
para abrir qualquer trincheira
na carne seca do futuro
meta dentro dessa meta
a chama da lamparina
com facho de fogo na retina
pra clarear o fosso escuro
6
outubro - 2022
a
mulher dos sonhos
voltou
ontem
sedenta
faminta insaciável
esgotou-me
à
última gota
mesmo
vazio
me
senti um tanto cheio
nem
foi delírio loucura
porque
vi no meu e-mail
o
nome da criatura
*
Em 1995 no Centro Cultural Maria Antônia, na USP, em cia da minha querida amiga Silvia Passareli, assisti uma encenação de Cacá de Carvalho, com texto de Pirandello que me pegou da medula ao osso. A plateia era de 40 pessoas apenas e Cacá circulava entre nós com a sua energia pulsante magnética. O texto era um fragmento de uma trilogia que ele deu o nome de O Homem Com A Flor Na Boca. E a ele, Cacá de Carvalho, dedicamos este livro
chamaram-me atrevido
o fonema entrou pelos ouvidos
como um raio de Iansã
Eva nem percebeu
a serpente no espelho
a mordida na Maçã
*
Deus não joga dados
Mas
a gente lança
tenta
–
em
arte tudo se inventa
Eu
tenho flores
com
a língua atravessada em cada canto da boca
Dê
Líricas
para Sofia Brito
bebo teus olhos atlânticos
e tua voz portuguesa
como quem bebe no Tejo
saudades de Lisboa
caminho com os teus passos
em direção ao poema do desassossego
Florbela Espanca Alberto Caieiro Fernando
Pessoa
*
ressignificar eis o verbo
no poema do absinto
o sentido mais concreto
ou mesmo o abstrato
na argamassa do absurdo
*
Baudeléricas Bordelíricas
o poema um beijo em tua boca bruna tem um B entranhado entre as coxas a pele das amoras gemem quando venta forte em tuas fendas do hoje comi duas nessa manhã incendiária quando vim da cacomanga trouxe nos bolsos da calça remendada linha carretel cola de trigo cerol bambu papel de pipa pique bandeira pique esconde jabuti preá da índia pés de abóboras replantáveis o pé de abacate ainda não nasceu Isadora chegou ontem 30 de março numa tarde outono à sol aberto noite gelada frio na medula maya ainda escreve sobre depressão no tempo folks may abriu as asas pra malásia e a outra mora do outro lado em outra terra rio grande muito longe tenho sede
*
a flor da pele ainda sangra
quixaba uma palavra estranha
assim como katchup guanabara guaxindiba
guarapari lembra-me índio capixaba
goiaba carne vermelha
o corpo nu diante do espelho
página do livro onde grafitei
o couro cru & carne viva
alga marinha nascida em mar de angra
a flor da pele ainda sangra
como último beijo mordido na boca
sem
sinal de despedida
*
com
os dentes cravados na memória
tontas vezes me re-par-to mul-ti-pli-co em 7
alegria dos noves fora nada tudo é baudelérico federico me dizia leonardo fez
80 afonso 84 na rede somos 3 quando ele vem já somos 4 em temporais escrevo e
sangro como boi antes da morte muitos outros já se foram e nem gozaram em 69 se
eu me lembrar 64 não posso esquecer 68 era uma noite de maio peguei o trem pra
são cristóvão depois avião para brasília quando voltei no espelho dédala já
estava dentro da tipografia
Ofício de Poeta
I
franzir a noite
é o mesmo que bordar o dia
costuro o tempo
com linha de pescar moinhos de vento
entre o franzido e o bordado
escrevo um desenredo
e vou foto.grafando
filmando poesia
na solidão dos meus brinquedos
II
costuro arco-íris
com linhas de bordar
teus olhos d´água
III
pego na enxada diariamente
para capinar o quintal
da estação três cinco três
literalmente
não é metáfora
para lamber cio da terra
como na canção que Chico fez
IV
a poesia as vezes me vem da fala
outras de vozes absurdas
na travessia cantei pontos de Jongo
Folias de Reis Festas Juninas
Folguedos de São João
despachos de Macumba
para me defender do capataz
pulei fogueira em brasa
comi o milho assado
nos tempos do nunca mais
nunca vivi porto seguro
na minha praia não tem cais
escrevo como falo aprendi com os
ancestrais
V
com uma câmera nas mãos
um poema na cabeça
vamos filmar o poema
antes que desapareça
A
mulher dos sonhos
ela
ainda guarda na boca este poema entre os dentes a língua saliva sílaba por
sílaba as palavras que invento ela fala em meus versos ao sabor do vento
enquanto freud não explica o que ainda não fizemos ela mastiga meus biscoitos
finos e vê nos búzios minhas mãos de fogo quando tem no livro este incenso
aceso as entre minhas em entre linhas salta das metáforas por entre
portas e janelas
*
arde em mim
um rio
de palavras
corpo larvas erupção
mar de fogo
vulcão
*
no romance do Poema
Mário Faustino traçou o seu destino
FederikaLispector
havia ali
o voo
em que Faustino
se dissolveu
no ar
tornou-se
fausto
anjo
aéreo
Herbert Valente de Oliveira
Irreverência ou Morte!
Gigi
Mocidade
escrevo para não morrer antes da morte
Federico
Baudelaire
o poema é um lance de dados
mas não fugirá ao
acaso
Stéphane Mallarmé
imagens sempre me levam a viagens impensadas fotografias me levam a grafias outras imagens recriadas escrevo não como Manuel Bandeira para não morrer mas como Federico Baudelaire para não morrer antes da morte. ontem o sonho me trouxe ela de volta leve como espuma quando beija a pele da areia. muitas vezes imagens me levam a viajar - como deve ser escrever para não enlouquecer ¿ muitas vezes algas que ela traz no mar da boca desce abaixo do umbigo e se encaixa entre as coxas encharca a língua de saliva e me lembra algum despacho Olga Savary quando me diz que mar é
*
poema
o poema pode ser um beijo em
tua boca a orelha de Van Gog bandeirinhas de Volpi os rabiscos de Miró o
assassinato de Lorca o poema pode ser o que vai o que não fica
Lupicínio na Mangueira Noel Rosa na Portela uma jangada de velas um parangolé
do Oiticica o poema pode ser os meus músculos de ossos a minha pele de sangue a
morte ancestral em cada mangue e os negros nervos de aço estraçalhados em
Martinica o bombardeio de Guernica o cubismo de Picasso
*
o
Delírio é a Lira do Poeta
se o Poeta não
Delira
sua Lira não
Profeta
ando tendo sonhos antropológicos que mais parecem pesadelos e a desgraça é tanta que dói até nos cotovelos
*
poesia
à
flor da barra
amor à primeira vista
meu livro vermelho de sangue
Ouro Preto na contra capa
a musa morta no mangue
rosa vermelha no altar
desejo paixão fogo brasa
incêndio na minha casa
para nunca mais se apagar
*
poema
1
o
que você faria
se
soubesse que és musa
de
dois poetas tortos ?
um
visivelmente você sabe
o
outro se oculta
por
trás da lua nova
quando
deita rede na varanda
com sua luz de zinco prata
o
que você faria
se
hoje eu te dissesse
que
o tempo tarda mas não finda
e
que a lua só é nova
porque
se preservou dentro da mata
curuminha ainda ?
poema 2
esse poema mora dentro de ti
entre pele pelos músculos nervos ossos
quase pronto
mas sempre inacabado
não importa o caminho ou se
Cronos
o disperse em curvas de distâncias
ou que o carinho não baste
quando é sede e fome o que
se tem no corpo
*
não sei por quantas vezes
nem sei por quantos anos
um pássaro leva para se abrigar no
ninho
ou para fazer de um fio elétrico
o seu lugar de pouso
quando quase tudo no poema ainda está
por vir
só sei que pode sol e chuva atrapalhar
o canto
mas será sempre no teu colo que ele
um dia irá dormir
poema
3
o
homem com a flor na boca
faz
dos seus versos
poesia
um tanto prosa
tem
na pele o couro cru
e
um parangolé
pendurado
no pescoço
onde
pensamos nervos
no
seu corpo - ali é osso
tua língua atravessa
o
pontal das coxas
quando
o leito do seu rio
transborda
um oceano
carrega
espinhos na carne
como
fossem pétalas de rosa
com
os dentes rasga da musa
-
todo pano - e ali mesmo goza
*
A folha de papel em branco sobrevoa a transparência diante do espelho onde me espreitam dois grandes olhos feito jabuticabas de um pomar que inda procuro a palavra escrita ainda não dita de um desejo impuro e a folha branca de papel pousa em tuas mãos como um pássaro não nascido ainda vindo do futuro
*
se sou torto não importa
em cada porta risco um ponto
pra revelar os meus destroços
no alfabeto do desterro
a carnadura dos meus ossos
hoje
o maior desafio
permanecer
Nu cio
ando em alpha
quase beta
meu destino ser poeta
*
poema
4
meus olhos
atravessam
as lentes - o peixe
e caminham em
direção a luz
que está do outro
lado
o infinito
que me espera com
seus
olhos d´água
ela virá com sua
boca
de batom marrom
vermelho
e eu espero
com minhas 7
línguas
atrás da porta
com o mel e o
veneno
a pimenta e o
azeite
vamos devorar o
peixe
no caldeirão
incandescente
em nossas línguas
só flechas - o fogo
a águardente –
poema
10
meus
caninos
já
foram místicos
simbolistas
sócio
políticos
sensuais
eróticos
mordendo
alguma história
agora
estão famintos
cravados
na memória
poema 11
escorre - nus
teus seios
espuma que jorrei
em tua boca
ainda existe algo
entre as coxas
e as costas
algas - água
o sal da língua
que lambeu a tua ostra
poema 12
tem algo de errado
nessas
estatísticas de mortes
dessa
pandemia
multipliquem
60.000 X 10
e
ainda não vai ser exato
o
número de cadáveres
empilhados
nos campos de concentração
que
dá um nome ao país
que ainda nem era uma nação
poema
13
arranco mais uma pérola
do ventre de hilda triste
na porta da tua casa
meu poema ainda insiste
a menina que matou o tempo
o vento também comia
na lâmina do catavento
pra espantar a maresia
nas ruínas de santa teresa
era domingo de poesia
bateu uma pedra no rock
e nos levou na ventania
poema 16
respiro-te enquanto escrevo
teu cheiro trazido pelo vento
vem da carne de manga
que mastiguei cinco minutos
tens o poder de me deixar em alfa
e me levar aos píncaros
nesse estado êxtase
quando estou em transe
quando
alfa é beta
e o luar da tarde são teus olhos raios
quando os meus acerta
poema 17
fiz
um trato com a ironia
o
sarcasmo a poesia
o
bom humor a picardia
para
enfrentar essa tragédia
tenho
de sobra a alegria
e
o que não falta em mim é cobra
visceral antropofagia
tenho
de sobra em minha obra
profanação sagrada orgia
poema 18
nos meus delírios baudeléricos
ou mesmo fossem baudelíricos
sonho teu corpo flor de cactos
como se fossem flor de lírios
toco teus pelos flor do mangue
pulsando sangue em teus martírios
penso teu sexo flor de lótus
sagrada flor dos meus delírios
poema
19
a
língua hoje passeia
pelos
martírios de florbela
em
tudo que ela não disse
ou
mesmo exposto não revela
pelas
janelas do corpo
por
todas dores prazeres
no
que ficou por dizeres
no
silêncio quando cala
por
tudo que ainda não cabe
na
sensualidade da fala
e talheres sobre a mesa
onde tudo cabe
desde que não seja lama
desde que não seja Vale
*
holocausto
quem se alimenta
dessa dor
desse horror
desse holocausto
desse país em ruínas
da exploração dessas minas
defloração desse cabaço
quem avaliza o des(governo
simboliza esse fracasso?
os 270 mortos
em Brumadinho
mostram que
nesse hospício
há muita lama
no meio do caminho
*
fake
book
o face detonou
minha família
inteira
e lá se foram
os meus amores
carnavais
e agora o que é que
eu faço
sem as Anas sem as
Eras
as Cristinas
Isadoras Micaelas
Vênus Afrodites
todas elas
os bem-me-quer dos
meu aceiros
e dos meus canaviais
essa rede assim fascista
não comporta
os meus poemas
canibais
crise
diante dessa crise tanta
não adianta
fazer o que não deve
no improviso do repente
poeta inteligente
não inventa: escreve
*
ando
tão
tenso
nesse
tempo
estático
que
não consigo
escrever
tudo que penso
leia mais no blog
Nenhum comentário:
Postar um comentário