UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS
HUMANAS
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO
VIDEOPOESIA NA ERA DO LIKE:
MÍDIAS SOCIAIS COMO JANELAS DE EXIBIÇÃO
Marcelo Barros - Rio de Janeiro/RJ
- 2020
Entrevista
Artur Gomes (RJ)
entrevistado via e-mail por Marcelo Barros / Tchello d’Barros (RJ) para a
pesquisa Videopoesia na era do like: mídias sociais como janelas de
exibição, na ECO/UFRJ. 24-26 nov.2020.
Artur Gomes
Poeta, cineasta, performer,
curador e produtor cultural.
É natural de Campos dos Goytacazes (RJ), onde vive. Ministra
cursos no Cefet e oficinas na rede Sesc. Com diversos prêmios no Brasil e
Exterior, sua trajetória pela Poesia Experimental iniciou na década de 1980,
transitando por diversas linguagens e mídias, constituindo um extenso portfólio
que passa pela Videopoesia, Poesia Visual, Performance, Teatro, Fotografia e
Audiovisual. Entre seus livros de poemas publicados estão Juras
secretas, Pátria a(r)mada, O homem com a flor na
boca, O poeta enquanto coisa e o recente
projeto Com os dentes cravados na memória. Organizou
significativas mostras de Poesia Visual e curadorias em Videopoesia. Fundador e
diretor da Fulinaíma MultiProjetos culturais, atualmente tem
realizado atividades artísticas em diversas instituições pelo Brasil.
Tchello
d’Barros: Autor de uma extensa produção em videopomas, você iniciou nessa
linguagem ainda antes do fenômeno das Mídias Sociais. Em que circunstâncias e
circuitos eram exibidos tais trabalhos?
Artur Gomes: Quando
iniciei essa trajetória lá pelos idos dos anos de 1980, eu estava na ativa na
então Escola Técnica Federal de Campos, que é hoje o Instituto Federal
Fluminense - IFF. Essa produção era feita pelo Departamento Audiovisual, que
atendia as demandas gerais da Escola, e como eu dirigia a Oficina de Artes
Cênicas, toda encenação era documentada pelo Departamento Audiovisual. Daí,
comecei a produzir videopoemas em 1983, quando criei a Mostra Visual de
Poesia Brasileira, que produzi e executei até o ano de
1994. Os vídeos eram exibidos em TV, salas de aula e auditórios. Essa
mostra foi realizada uma vez por ano em cidades como Campos dos Goytacazes,
Macaé, Miracema e Rio de Janeiro, no Estado do Rio. Em 1993 ela foi realizada
em São Paulo, São Caetano, Santo André e São Bernardo, num projeto executado
pelo SESC-SP. Em 1994 foi realizada em Teresina (PI), com apoio da Universidade
Federal do Piauí – UFPI e União Brasileira de Escritores - UBE.
Figura 1 –
Captura de tela do videopoema Poesia in Concert I
https://www.youtube.
com/watch?v=TwA3RZXkaqQ
Fonte:
Canal Artur Gomes na Mídia Social Youtube
Td’B: Em seu videopoema Poesia
In Concert I, acessável no Youtube, você mistura linguagens: são áudios de
poesia sonora, fotografia, música, atuação, sobreposição de filmagens e
registros de videoperformance. Existe um fio condutor em seu processo criativo
que justifica essa convergência de linguagens?
AG: Existe
sim: o propósito de experimentar linguagens. O conceito que dou à palavra Fulinaíma é
a possibilidade das misturas, mixegenar a linguagem. Quando resolvi começar a
experimentar pra valer a produção audiovisual com poesia, foi exatamente para
aproveitar essa plataforma para divulgar poesia. Em 2007 comecei com Jiddu
Saldanha, a fazer vídeo com uma câmera de 5 megapixels. No Youtube tem vídeos
dessa primeira experiência. A partir daí, comecei a entender as possibilidades
que o programa de edição me oferecia para que a experimentação não tivesse
limites.
Td’B: Considerando-se que você
organizava nos Anos 80 a Mostra Visual de Poesia Brasileira (SP) e nesta década
realizou edições da Mostra Internacional de Poesia Visual (RS), como você interpreta
o parentesco entre essa modalidade de expressão artística, geralmente gráfica e
estática, com a imagem em movimento da Videopoesia?
AG: A partir
do envolvimento com essas mostras e eventos, comecei a ver o poema, não apenas
como palavra, mas também como grafismo, plasticidade, movimento, para juntar
tudo isso com a fala. A oralidade do poema para mim é onde ele fala mais alto,
onde ele toca outros sentidos. Essa inquietação me levou a criar em Campos dos
Goytacazes em 1999 o FestCampos de Poesia Falada, que foi realizado pela
Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima até o ano de 2019.
Td’B: Seu histórico é de
participação em relevantes festivais literários do Brasil, como o Psiu Poético
(MG), Congresso Brasileiro de Poesia (RS) e o Art&Fatos Poéticos (SP),
encontros com Videopoesia na programação. Ao mesmo tempo, sua intensiva atuação
nas Mídias Sociais inclui a disseminação de seus videopoemas nesse meio
digital. A Videopoesia em eventos presenciais está com os dias contados ou as
mídias sociais são apenas mais uma janela para exibição de videopoemas?
AG: Acredito
que o momento faz com que estejamos tendo que utilizar as redes sociais, o
virtual, para a disseminação de nossos projetos, nossas performances e
videopoemas. Mas para mim a ocupação do espaço físico com poesia é
fundamental, porque sei que sem poesia uma cidade não é nada. Pelo menos
tenho a intenção de levar para um espaço físico a Mostra Cine Vídeo de Poesia
Falada, que estou começando a produzir.
Td’B: O poeta e cineasta Herman
Berlandt (EUA), um dos precursores teóricos do Poetry Film ou Videopoetry,
apontava que para uma obra audiovisual ser considerada um videopoema deveria
conter ao menos um poema narrado ou o texto de alguma forma escrito na tela
(Meyer, 2019, p.42). Essa afirmação ainda será válida para a próxima década? E
ainda: há alguma teoria ou conceito que norteia suas criações
audiovisuais?
AG: Eu sou
levado pela prática. Meus conceitos e teorias, se é que eles existam, nascem
depois do que pratico, experimento, executo. Acredito que essas afirmações
tentando definir como o poema deve ser escrito, como deve ser falado, como deve
ser levado para o audiovisual, limitam a criatividade.
Td’B: Você foi curador da Kinopoéticas
- Mostra Internacional de Audiovisual (2015), evento presencial onde
os videopoemas foram exibidos em telas de computador, TV de plasma e projeção
em telão de auditório. Já sua atual Mostra Cine Vídeo de Poesia Falada é
exibida diretamente nas Mídias Sociais. Como você tem percebido a reação do
público nestes dois ambientes?
AG: Quando a Mostra é exibida em um espaço físico, ela tem tempo
determinado para acontecer, e esse tempo certamente acaba limitando o acesso do
público ao que está sendo exposto. Nas mídias sociais, isso não acontece, a
Mostra pode não estar em destaque em algum espaço virtual, mas se ela existe,
você faz uma busca no Google que, se o assunto lhe interessa, você vai tê-lo
diante dos olhos. Mas para a atual geração, ocupar as redes sociais com
seus videopoemas parece ser o bastante.
Td’B: Em sua trajetória, você
teve contato presencial com nomes seminais que se dedicaram à linguagens
múltiplas, como Videopoesia, Performance, Poesia Sonora e Poesia Visual, a
exemplo de E. M. Melo e Castro (POR), Fernando Aguiar (POR), Enzo Minarelli
(ITA), Julien Blaine (FRA), Clemente Padin (URU) e Jiddu Saldanha (BRA). Que
aprendizado com estas referências da Poesia Experimental merece ser repassado
para a parcela que se interessa por arte da cada vez mais conectada
geração millennial?
AG: Sim, todos
esses poetas citados, estiveram presentes com sua poesia, em pelo menos uma das
edições das Mostras que produzi. Alguns não apenas em uma edição, mais em
várias. Posso citar pelo menos mais quatro poetas que contribuíram
decisivamente para me lançar na experimentação, e nos processos criativos,
como: Almandrade, Hugo Pontes, Uilcon Pereira e Moacy Cirne. Acho que todos
esses poetas merecem ser pesquisados e estudados por todos que se interessam em
experimentação de múltiplas linguagens. E esse legado pus em prática
quando comecei a produzir a Mostra Visual de Poesia Brasileira: a intenção não
era apenas expor videopoemas, mas todas as linguagens contemporâneas
experimentais. Duas frases que li, acho que servem para a geração millennial:
“olhar com olhos livres” (Oswald de Andrade), e “experimentar a produção
poética conjugando o verbo V(L)ER” (Uilcon Pereira).
BARROS, M. Videopoesia na era do like: mídias sociais como janelas de exibição. Monografia. Rio de Janeiro: UFRJ, 2020, 69p.
Tchello d'Barros é um catarinense radicado no Rio de Janeiro, que dedica-se desde 1993 às linguagens de Literatura, Artes Visuais e Audiovisual. Graduado em Comunicação Social, cursa mestrado na UFRJ, atuando profissionalmente como curador, roteirista e produtor cultural. Com 10 livros publicados e textos em uma centena de antologias e didáticos, suas obras visuais já integraram mais de 200 exposições nos 20 países que percorreu em constantes atividades artísticas. Eventualmente ministra oficinas, palestras e diversas atividades culturais no Brasil e exterior. A Poesia Experimental em seu amplo arco temático e conceitual é objeto de sua pesquisa no mestrado em Artes da Cena, que desenvolve no PPGAC da ECO/UFRJ. O fenômeno poético em sua amplitude é investigado nas perspectivas da Poesia Visual, Escrita Assêmica e Videoarte.
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