terça-feira, 9 de abril de 2024

Tchello d´Barros entrevista Artur Gomes


UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO

 

VIDEOPOESIA NA ERA DO LIKE:

MÍDIAS SOCIAIS COMO JANELAS DE EXIBIÇÃO

 Marcelo Barros - Rio de Janeiro/RJ - 2020

 Entrevista

Artur Gomes (RJ) entrevistado via e-mail por Marcelo Barros / Tchello d’Barros (RJ) para a pesquisa Videopoesia na era do like: mídias sociais como janelas de exibição, na ECO/UFRJ. 24-26 nov.2020.

Artur Gomes

Poeta, cineasta, performer, curador e produtor cultural.

É natural de Campos dos Goytacazes (RJ), onde vive. Ministra cursos no Cefet e oficinas na rede Sesc. Com diversos prêmios no Brasil e Exterior, sua trajetória pela Poesia Experimental iniciou na década de 1980, transitando por diversas linguagens e mídias, constituindo um extenso portfólio que passa pela Videopoesia, Poesia Visual, Performance, Teatro, Fotografia e Audiovisual. Entre seus livros de poemas publicados estão Juras secretas, Pátria a(r)mada, O homem com a flor na bocaO poeta enquanto coisa e o recente projeto Com os dentes cravados na memória. Organizou significativas mostras de Poesia Visual e curadorias em Videopoesia. Fundador e diretor da Fulinaíma MultiProjetos culturais, atualmente tem realizado atividades artísticas em diversas instituições pelo Brasil.

 Tchello d’Barros: Autor de uma extensa produção em videopomas, você iniciou nessa linguagem ainda antes do fenômeno das Mídias Sociais. Em que circunstâncias e circuitos eram exibidos tais trabalhos?

 Artur Gomes: Quando iniciei essa trajetória lá pelos idos dos anos de 1980, eu estava na ativa na então Escola Técnica Federal de Campos, que é hoje o Instituto Federal Fluminense - IFF. Essa produção era feita pelo Departamento Audiovisual, que atendia as demandas gerais da Escola, e como eu dirigia a Oficina de Artes Cênicas, toda encenação era documentada pelo Departamento Audiovisual. Daí, comecei a produzir videopoemas em 1983, quando criei a Mostra Visual de Poesia Brasileira, que produzi e executei até o ano de 1994. Os vídeos eram exibidos em TV, salas de aula e auditórios. Essa mostra foi realizada uma vez por ano em cidades como Campos dos Goytacazes, Macaé, Miracema e Rio de Janeiro, no Estado do Rio. Em 1993 ela foi realizada em São Paulo, São Caetano, Santo André e São Bernardo, num projeto executado pelo SESC-SP. Em 1994 foi realizada em Teresina (PI), com apoio da Universidade Federal do Piauí – UFPI e União Brasileira de Escritores - UBE.

Figura 1 – Captura de tela do videopoema Poesia in Concert I

https://www.youtube.

com/watch?v=TwA3RZXkaqQ

 

                   Fonte: Canal Artur Gomes na Mídia Social Youtube

 

Td’B: Em seu videopoema Poesia In Concert I, acessável no Youtube, você mistura linguagens: são áudios de poesia sonora, fotografia, música, atuação, sobreposição de filmagens e registros de videoperformance. Existe um fio condutor em seu processo criativo que justifica essa convergência de linguagens? 

 

AG: Existe sim: o propósito de experimentar linguagens. O conceito que dou à palavra Fulinaíma é a possibilidade das misturas, mixegenar a linguagem. Quando resolvi começar a experimentar pra valer a produção audiovisual com poesia, foi exatamente para aproveitar essa plataforma para divulgar poesia. Em 2007 comecei com Jiddu Saldanha, a fazer vídeo com uma câmera de 5 megapixels. No Youtube tem vídeos dessa primeira experiência. A partir daí, comecei a entender as possibilidades que o programa de edição me oferecia para que a experimentação não tivesse limites.

 

Td’B: Considerando-se que você organizava nos Anos 80 a Mostra Visual de Poesia Brasileira (SP) e nesta década realizou edições da Mostra Internacional de Poesia Visual (RS), como você interpreta o parentesco entre essa modalidade de expressão artística, geralmente gráfica e estática, com a imagem em movimento da Videopoesia? 

 

AG: A partir do envolvimento com essas mostras e eventos, comecei a ver o poema, não apenas como palavra, mas também como grafismo, plasticidade, movimento, para juntar tudo isso com a fala. A oralidade do poema para mim é onde ele fala mais alto, onde ele toca outros sentidos. Essa inquietação me levou a criar em Campos dos Goytacazes em 1999 o FestCampos de Poesia Falada, que foi realizado pela Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima até o ano de 2019.

 

Td’B: Seu histórico é de participação em relevantes festivais literários do Brasil, como o Psiu Poético (MG), Congresso Brasileiro de Poesia (RS) e o Art&Fatos Poéticos (SP), encontros com Videopoesia na programação. Ao mesmo tempo, sua intensiva atuação nas Mídias Sociais inclui a disseminação de seus videopoemas nesse meio digital. A Videopoesia em eventos presenciais está com os dias contados ou as mídias sociais são apenas mais uma janela para exibição de videopoemas? 

 

AG: Acredito que o momento faz com que estejamos tendo que utilizar as redes sociais, o virtual, para a disseminação de nossos projetos, nossas performances e videopoemas. Mas para mim a ocupação do espaço físico com poesia é fundamental, porque sei que sem poesia uma cidade não é nada. Pelo menos tenho a intenção de levar para um espaço físico a Mostra Cine Vídeo de Poesia Falada, que estou começando a produzir.

 

Td’B: O poeta e cineasta Herman Berlandt (EUA), um dos precursores teóricos do Poetry Film ou Videopoetry, apontava que para uma obra audiovisual ser considerada um videopoema deveria conter ao menos um poema narrado ou o texto de alguma forma escrito na tela (Meyer, 2019, p.42). Essa afirmação ainda será válida para a próxima década? E ainda: há alguma teoria ou conceito que norteia suas criações audiovisuais?  

 

AG: Eu sou levado pela prática. Meus conceitos e teorias, se é que eles existam, nascem depois do que pratico, experimento, executo. Acredito que essas afirmações tentando definir como o poema deve ser escrito, como deve ser falado, como deve ser levado para o audiovisual, limitam a criatividade.

 

Td’B: Você foi curador da Kinopoéticas - Mostra Internacional de Audiovisual (2015), evento presencial onde os videopoemas foram exibidos em telas de computador, TV de plasma e projeção em telão de auditório. Já sua atual Mostra Cine Vídeo de Poesia Falada é exibida diretamente nas Mídias Sociais. Como você tem percebido a reação do público nestes dois ambientes?  

 

AG: Quando a Mostra é exibida em um espaço físico, ela tem tempo determinado para acontecer, e esse tempo certamente acaba limitando o acesso do público ao que está sendo exposto. Nas mídias sociais, isso não acontece, a Mostra pode não estar em destaque em algum espaço virtual, mas se ela existe, você faz uma busca no Google que, se o assunto lhe interessa, você vai tê-lo diante dos olhos. Mas para a atual geração, ocupar as redes sociais com seus videopoemas parece ser o bastante.

 

Td’B: Em sua trajetória, você teve contato presencial com nomes seminais que se dedicaram à linguagens múltiplas, como Videopoesia, Performance, Poesia Sonora e Poesia Visual, a exemplo de E. M. Melo e Castro (POR), Fernando Aguiar (POR), Enzo Minarelli (ITA), Julien Blaine (FRA), Clemente Padin (URU) e Jiddu Saldanha (BRA). Que aprendizado com estas referências da Poesia Experimental merece ser repassado para a parcela que se interessa por arte da cada vez mais conectada geração millennial

 

AG: Sim, todos esses poetas citados, estiveram presentes com sua poesia, em pelo menos uma das edições das Mostras que produzi. Alguns não apenas em uma edição, mais em várias. Posso citar pelo menos mais quatro poetas que contribuíram decisivamente para me lançar na experimentação, e nos processos criativos, como: Almandrade, Hugo Pontes, Uilcon Pereira e Moacy Cirne. Acho que todos esses poetas merecem ser pesquisados e estudados por todos que se interessam em experimentação de múltiplas linguagens. E esse legado pus em prática quando comecei a produzir a Mostra Visual de Poesia Brasileira: a intenção não era apenas expor videopoemas, mas todas as linguagens contemporâneas experimentais. Duas frases que li, acho que servem para a geração millennial: “olhar com olhos livres” (Oswald de Andrade), e “experimentar a produção poética conjugando o verbo V(L)ER” (Uilcon Pereira).

 

BARROS, M. Videopoesia na era do like: mídias sociais como janelas de exibição. Monografia. Rio de Janeiro: UFRJ, 2020, 69p.


Tchello d'Barros
é um catarinense radicado no Rio de Janeiro, que dedica-se desde 1993 às linguagens de Literatura, Artes Visuais e Audiovisual. Graduado em Comunicação Social, cursa mestrado na UFRJ, atuando profissionalmente como curador, roteirista e produtor cultural. Com 10 livros publicados e textos em uma centena de antologias e didáticos, suas obras visuais já integraram mais de 200 exposições nos 20 países que percorreu em constantes atividades artísticas. Eventualmente ministra oficinas, palestras e diversas atividades culturais no Brasil e exterior. A Poesia Experimental em seu amplo arco temático e conceitual é objeto de sua pesquisa no mestrado em Artes da Cena, que desenvolve no PPGAC da ECO/UFRJ. O fenômeno poético em sua amplitude é investigado nas perspectivas da Poesia Visual, Escrita Assêmica e Videoarte.




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